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Araçatuba, SP, Brazil
Professor e Advogado militante no ramo do direito previdenciário.

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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

“O DIREITO CONTRATUAL NA PÓS-MODERNIDADE E NA SUA VERTENTE DIFUSA”


LUIZ GUSTAVO BOIAM PANCOTTI

ADVOGADO,

CONSULTOR JURÍDICO,

PROFESSOR UNIVERSITÁRIO,


ESPECIALISTA EM DIREITO PROCESSUAL – PUC/SP,


MESTRE EM DIREITO DIFUSOS E COLETIVOS – UNIMES,

DOUTORANDO EM DIREITO PREVIDENCIÁRIO PELA PUC/SP

O principal foco do estudo centraliza-se no Direito Civil Constitucional.

Neste caso, há uma análise do Direito Civil – relações de consumo – tendo em vista, e até mesmo como ponto de origem, a Constituição Federal de 1988.

Para que se possa ter uma percepção mais apurada do assunto, sugerimos um pensamento de acordo com o seguinte raciocínio: o sistema jurídico seria como um sistema solar. O sol – peça principal do sistema - seria a Constituição Federal de 1988, onde um dos planetas principais seria o Código Civil. Em torno deste planeta (Código Civil) há um micro sistema solar formado por vários satélites, que nada mais são do que os diversos estatutos jurídicos civis existentes: E.C.A., C.D.C., Lei de Locação, Lei da Impenhorabilidade dos Bens de Família, etc.

Conclui-se, desta maneira, que não podemos encarar o direito privado sem se ater à própria Constituição Federal e aos seus princípios, sejam eles fundamentais ou não.

Diante disto, pergunta-se: como se verifica o corte de fornecimento da prestação de um serviço público essencial, ante a falta de pagamento?

Salienta-se desde já que não será analisada tão somente a questão da interrupção do serviço público, isto é, se deve ser ou não contínuo, ou ainda, a natureza jurídica do tributo que embasa a forma de pagamento desta contraprestação. Tentar-se-á analisar a fundo o fundamento maior que dá suporte constitucional para a impossibilidade da interrupção do fornecimento do serviço público.

Para que possamos formar um elemento de convicção sobre o tema, suponhamos, v.g., que um enfermo que dependa da UTI que tem no interior da sua residência, falece em razão do corte do fornecimento da energia elétrica por falta de pagamento.

Partindo do raciocínio acima sugerido sobre a constitucionalização dos direitos privados, analisemos o artigo 22 e o 42 da Lei 8.078/90, in verbis:

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

“Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.”

Sem embargos pode-se dizer que a energia elétrica trata-se de um serviço público essencial prestado por concessionária prestadora de serviço público. Assim, a continuidade impera na forma da prestação dos seus serviços, a qual é definida como aquela não passível de interrupção independente da causa que a incida.

No que tange o artigo 42, o CDC explicita que é vedado ao consumidor a sua exposição ao ridículo e a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça contra o inadimplente.

Assim, sendo o Código de Defesa do Consumidor um “satélite” do Código Civil (planeta), deve este ser aplicado com base na premissa maior, ou seja, a Constituição Federal (sol). Desta forma, não vislumbramos nenhum empecilho que obsta a aplicação das normas constitucionais no direito privado, ao contrário, deve-se aplicar de forma incisiva.

O artigo 42 do CDC dá uma forma de aplicação da lei à pessoa humana que tem por característica a prevalência de sua dignidade.

Para que se possa ter uma visão mais clara do tema, explica-se desde já que há vários Princípios do Direito Civil Constitucional, porém citaremos os mais relevante a saber:

· Proteção da Dignidade da Pessoa Humana: previsto no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal. No aspecto material, trata-se do princípio em que o Estado deve dar ao cidadão um piso mínimo existencial, que dizer. dar um mínimo de garantia para que ele possa existir e viver com respeito. Para que o cidadão tenha uma vida digna, o Estado deve praticar certas atividades em determinados casos. Além disto, a dignidade da pessoa humana no seu aspecto moral se refere ao respeito que o Estado deve ter com o próprio cidadão.

· Solidariedade Social: previsto no artigo 3º, inciso I da Constituição Federal. Neste caso há a busca de uma sociedade mais justa e solidária, com vistas à erradicação da pobreza. Nada mais é do que o direito de terceira geração compreendidos em: direito à paz, direito ao desenvolvimento, direito ao patrimônio comum da humanidade – meio ambiente.

· Isonomia ou Igualdade “latu senso”: previsto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal. Está consubstanciada na máxima: “A lei deve tratar de maneira iguais os iguais e de maneira desigual os desiguais.” Encontra-se na primeira parte desta expressão a igualdade strictu sensu, e na outra o Princípio da Especialidade – cláusula pétra.

Nota-se, desta maneira que o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana tem uma função bem acentuada na aplicação das interpretações de todos os contratos, indistintamente.

Assim, acertadamente julgou o Ministro José Delgado, ao dizer que: O direito do cidadão de se utilizar dos serviços públicos essenciais para a sua vida em sociedade deve ser interpretado com vistas a beneficiar a quem deles se utiliza.”

A prevalência da dignidade da pessoa humana não pode ser abstraída em razão da autonomia privada da concessionária que se encontra em um patamar de superioridade. O Estado não pode deixar o cidadão à mercê de sua própria falta de sorte, desamparando-o no momento em que a dificuldade econômica lhe impõe a tomar decisões sérias para a sua sobrevivência.

No exemplo do enfermo citado no começo da exposição, fica claro que este não poderá dispensar o uso dos medicamentos excessivamente caros em detrimento do pagamento da energia elétrica que alimenta a UTI que possui no interior de sua casa.

Assim, parafraseando o trecho supra-citado da decisão do Min. José Delgado, é direito do cidadão a utilização dos serviços públicos essenciais. Isto nada mais é que o mínimo de vida digna que o Estado deve prestar à sua população.

Em que pese à delimitação do assunto debatido, não é demasiado dizer que em nenhum momento estamos tutelando o inadimplemento do usuário do serviço público, mas apenas a proibição dos usos de artifícios vexatórios os quais coloca em situação de inferioridade a dignidade do ser humano.

Visa, este tema, apenas garantir ao cidadão um mínimo de bem estar social, vivendo com dignidade, em sociedade justa, com fins à erradicação da pobreza.

Trata-se de tutelar a pessoa humana, possibilitando-lhe uma existência digna, aniquilando os ataques tão freqüentes à sua dignidade.